O céu sempre me pareceu mais claro por aquelas bandas. Curiosamente, quando a chuva se aproximava, torna-se de chumbo denso, juízo final, noite sem lua e sem promessa do raiar de um novo dia.
Havia muita alegria e também muito medo: de ciganos, comunistas, partida de mãe, gente autoritária que anestesia a alma da gente e de tarados.
E, quando finalmente chovia, todos os temores se agigantavam. Havia a maior de todas as fobias: João Sapo, um homenzinho rechonchudo de pouco mais de um metro de altura, que capinava lotes vagos, refazia cercas, apanhava e guardava lenhas e outras tarefas para as quais era contratado.
Carregava sempre dois embornais e, como a imagem de Santo Onofre, as alças cruzavam ao peito e, sobre os ombros carregava foice e enxada.
Terminada a empreita, ia-se embora com seus passos curtos enquanto eu, entrincheirada, esperava que ele dobrasse a esquina quando, aliviada, agradecia a Deus pelo final daquele dia.
(Extraído do livro "O Adestrador de Sentimentos de Stella Tavares publicado em 2007)